quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Maria Veleda (1871-1955) - Parte III

Atraída pelos caminhos da espiritualidade e do esoterismo e preocupada com o sentido da existência humana, aderiu ao espiritismo filosófico, científico e experimental. Fundou o Grupo Espiritualista Luz e Amor e, em 1925, dinamizou a organização do I Congresso Espírita Português e participou na criação da Federação Espírita Portuguesa. Fundou as Revistas A Asa, O Futuro e A Vanguarda Espírita e colaborou na imprensa espiritualista de todo o país, publicando poesia e artigos de pendor reflexivo e memorialista. Em 1950, publicou as ‘Memórias de Maria Veleda’ no jornal República, sobre a sua actividade feminista e republicana. As ‘Memórias de Maria Veleda’ são um testemunho das lutas empreendidas pelas mulheres em prol da sua emancipação e da implantação, defesa e consolidação da República.

Ela e outras mulheres instruídas e cultas souberam aproveitar os momentos de ruptura para reivindicar mais direitos na família, na sociedade e na política. Os direitos alcançados estiveram muito aquém do que esperavam e lhes foi prometido pelos seus correligionários, o que revela a grande distância entre o discurso pretensamente modernizador dos chefes republicanos e a prática política quando representaram e exerceram o poder. Eles não conseguiram libertar-se do próprio conservadorismo por não se sentirem seguros no controlo do poder ou por não saberem lidar com as pressões dos grupos descontentes, opositores e inimigos. O radicalismo do discurso oficial e os rumos da governação dificultaram consensos, entravaram processos e impediram a mobilização para objectivos e causas nacionais importantes. A ideia de modernidade apregoada, prometida e ambicionada para o país, veiculada através do discurso republicano, revelou-se frágil perante os obstáculos e sucumbiu perante uma conjuntura nacional e internacionalmente adversa.

Maria Veleda denunciou muitas vezes os desvios do programa do Partido Republicano, condenou as ambições pelo poder, a defesa dos interesses pessoais em detrimento dos interesses colectivos, a burocratomania dos arrivistas, barriguistas e recompensistas que considerou crimes de lesa-Pátria, como lamentou insistentemente o medo, o excessivo conservadorismo das mentalidades e a falta de ousadia dos republicanos no poder, quando estavam em causa a concessão do direito de sufrágio feminino e o alargamento dos direitos de cidadania. Maria Veleda e muitas outras mulheres sentiram-se traídas e, paulatinamente, foram perdendo a fé nos políticos, embora não esmorecessem nem desistissem de sonhar com a sociedade ideal, sob a égide da República. Ser mulher, republicana e feminista, afirmar-se num mundo de homens, defender ideias, bater-se por ideais, há mais de um século, terá sido tarefa mais difícil do que os famosos trabalhos de Hércules.

“Maria Veleda foi uma mulher ousada e combativa, professora e pedagoga notável, escritora brilhante e sensível, conferencista das mais insígnes, republicana e livre-pensadora coerente, dirigente feminista entusiasta que, pelo seu perfil e percurso singular, marcou o movimento feminista na época em que viveu.” Dedicou a vida aos ideais de justiça, liberdade, igualdade e democracia e empenhou-se na construção de uma sociedade melhor, onde todos pudessem ser felizes. Semeou ideias, iniciou processos de mudança nas práticas sociais e lançou o debate sobre os lugares, os papéis e os poderes de mulheres e homens num mundo novo.

Morreu feminista e republicana. No último artigo publicado no jornal República, em 1953, afirmava que nada pediu nem nada recebeu da República e disso se orgulhava. Escrevia ela naquele 43.º aniversário da implantação da República: - “Pobres éramos, pobres ficámos e pobres somos. Mas nas nossas almas arde sempre a mesma chama sacrossanta que nos iluminava quando gritámos pela primeira vez: - Viva a República! Nunca nos apercebemos de ideais que não pudessem ter imediata realização. Se as guerras que assolaram a Europa com todos os seus tormentos e horrores, não permitiram que a jovem República se expandisse melhor, o certo é que sempre esperámos dias mais tranquilos e o triunfo integral da Justiça sobre todas as iniquidades e da Verdade sobre todas as mentiras! (…) Poderão dizer que estávamos em erro. Se estávamos, ainda hoje estamos, persuadidas de que a felicidade dos povos depende de um regime que a todos iguale e se chama democracia. (…) Porque acima da morte que me espera está o ideal por que me norteio! Sim. – Viva a República!”.

Perante tal fé ilimitada nos ideais do regime republicano, gostava de poder falar com Maria Veleda e saber a sua opinião sobre o fim da comemoração da data da implantação da República, decretado por este governo, com o argumento de que a crise económica exige mais trabalho, mais produção e maior produtividade. Certo é que me responderia que a desvalorização da data significa a desvalorização do próprio regime republicano e dos ideais, valores e princípios que lhe estão subjacentes. Recordar-me-ia também, como desde há algumas décadas, se tem descurado a cultura humanista, reduzido o peso das Ciências Sociais e Humanas nos currículos escolares, descuidado a preservação da memória histórica, o sentido da identidade nacional e o desenvolvimento da cidadania, tudo em nome de um alto desígnio – o dinheiro. Tudo se tem submetido às exigências de um sistema económico que molda as cabeças e os espíritos para um presente e um futuro em que o mercado de emprego só absorve(rá) engenheiros, economistas, gestores, financeiros, analistas, informáticos, etc. -, únicos iluminados que conduzirão o país nos caminhos da competitividade, do progresso e da modernidade. Também se mostraria preocupada com as consequências desta mentalidade já visíveis no rumo dos acontecimentos e na desesperança visível nos rostos de jovens e velhos portugueses que, perplexos, assistem ao esboroar dos direitos e liberdades há muito conquistados e, indignados, se insurgem contra à crise de valores éticos e morais e protestam perante a pobreza material a que estas políticas os querem condenar. Que este momento contribua para uma maior consciência de que é preciso estar vigilante e lutar sempre por ideais, valores e igualdade de direitos numa sociedade livre e democrática, porque as vitórias conseguidas nunca estão garantidas nem são eternas.

Maria Veleda (1871-1955) - Parte II

Em 1912, o governo nomeou-a Delegada de Vigilância da Tutoria Central da Infância de Lisboa, instituição destinada a recolher as crianças desamparadas, pedintes ou delinquentes, cargo que ocupou até 1941. Desempenhou a árdua tarefa de visitar os bairros mais pobres, informar-se dos casos mais tristes e deprimentes, sob o ponto de vista da miséria material e moral, acompanhar os respectivos processos judiciais no Tribunal de Menores da Tutoria, vigiar os jovens delinquentes em liberdade, aconselhar, prevenir e encaminhar, sempre com o intuito de os recuperar para uma vida sã em sociedade.

Consciente da situação de desigualdade em que as mulheres viviam, numa sociedade conservadora e pouco aberta à mudança, iniciou, nos primeiros anos do século XX, um dos maiores combates da sua vida: defender a igualdade de direitos jurídicos, cívicos e políticos entre os sexos. Naquele tempo, as mulheres estavam, por imperativos económicos, sociais e culturais, confinadas à esfera doméstica, em situação de subalternidade, e, socialmente, tinham o estatuto de menoridade jurídica, cívica e política; as suas capacidades intelectuais e os trabalhos realizados eram desvalorizados, o que obstava a que fossem olhadas como pessoas autónomas e as impedia de fazerem livremente opções de vida.

Havia que trabalhar para que todas as mulheres tomassem consciência da situação de desigualdade e de sujeição em que viviam e despertassem para a necessidade de lutarem pela própria emancipação como pessoas e cidadãs. Na mira destes propósitos, Maria Veleda foi incansável na escrita em jornais e na oratória de tribuna, denunciando, questionando e propondo soluções para os problemas das mulheres, além de ter um papel importante na criação e dinamização das primeiras associações femininas e feministas, nas quais se destacou como dirigente ousada, por vezes radical, idealista, destemida, inteligente e humanista.

A emergência do movimento feminista português coincidiu com a expansão da propaganda republicana e a luta contra a monarquia. Convertida aos ideais republicanos, iniciada na Maçonaria e defensora do livre-pensamento, inicia outra frente de combate político pela implantação da República. Nos Centros Republicanos, participa nas reuniões, conspirações e planos de acção; escreve nos jornais e discursa em escolas liberais, associações operárias e intelectuais, fábricas, grémios, círios civis, teatros, juntas de paróquia e comícios do Partido Republicano, da Junta Federal do Livre- Pensamento e da Associação Promotora do Registo Civil. Alguns destes discursos e conferências foram publicados no livro A Conquista, prefaciado por António José de Almeida. Este insigne dirigente republicano considera que o livro de Maria Veleda traz “um vento novo de filosofia” e “arrojadas doutrinas” que são “em si o alimento primordial das gerações de hoje” e afirma “que a senhora D. Maria Veleda, cujo esbelto espírito tão audaciosamente veste a túnica das mais avançadas ideias, atingiu um raro poder de ductilidade que o leva a debater com vantagem os problemas essenciais da tarefa que se impuseram os revolucionários portugueses.” No balanço das etapas do percurso da luta republicana, salienta que o livro A Conquista prova que Maria Veleda “tem sido, nesta faina laboriosa e dura, uma operária de superior engenho e rara tenacidade. Fadou-a a natureza para realizar a propaganda dos grandes ideais entre as pessoas do seu sexo, que uma educação detestável tem escravizado entre nós, deixando- as no geral, desconhecedoras dos seus próprios direitos.”

Os méritos do seu trabalho e dedicação à causa republicana e à causa da emancipação feminina granjearam-lhe adepta/os e admiradora/es nos sectores liberais mas também inimigos entre a/os católica/os e monárquica/os mais conservadora/es. Sofreu incompreensões, insultos, perseguições e ameaças de morte que culminaram com a condenação por abuso de liberdade de imprensa, em 1909.

Entre 1910 e 1915, como dirigente da Liga Republicana das Mulheres Portuguesas e das revistas A Mulher e a Criança e A Madrugada, empenhou-se na luta pelo sufrágio feminino, escrevendo, discursando, fazendo petições e chefiando delegações e representações aos órgãos de soberania. Combateu a prostituição, sobretudo, a de menores, e o direito de fiança por abuso sexual de crianças. Fundou o Grupo das Treze para combater a superstição, o obscurantismo e o fanatismo religioso que afectavam sobretudo as mulheres e as impediam de se libertarem dos preconceitos sociais e da influência clerical que as mantinham submetidas aos dogmas da Igreja e à tutela masculina.

Depois da implantação da República, por ocasião das incursões monárquicas de Paiva Couceiro, integrou o Grupo Pró-Pátria e percorreu o país em missão de propaganda, discursando em defesa do regime ameaçado. Em 1915, em consonância com o Partido Democrático de Afonso Costa, juntou-se aos conspiradores na preparação do golpe revolucionário que destituíu o governo ditatorial do General Pimenta de Castro e, a seguir, envolveu-se na propaganda a favor da participação de Portugal na 1ª. Guerra Mundial.

Nesse mesmo ano, saíu da Liga Republicana das Mulheres Portuguesas, filiou-se no Partido Democrático e fundou a Associação Feminina de Propaganda Democrática, cuja acção terminou em 1916, em nome da União Sagrada de todos os portugueses, na defesa dos interesses da Pátria ameaçada.

Desiludida com a actuação dos governos republicanos que não cumpriram as promessas de conceder o voto às mulheres nem souberam orientar a República de modo a estabelecer as verdadeiras Igualdade, Liberdade e Fraternidade e construir uma sociedade mais justa e melhor, abandonou o activismo político e feminista em 1921, após os acontecimentos da “noite sangrenta”. Fez-se jornalista do Século e de A Pátria de Luanda, onde continuou a defender os ideais feministas e republicanos que sempre a nortearam.

Maria Veleda (1871-1955) - Parte I

Maria Veleda foi uma mulher pioneira na luta pela educação das crianças e pelos direitos das mulheres, destacando-se como uma das mais importantes dirigentes do movimento feminista português da primeira vaga.

Muito jovem, estreou-se na imprensa algarvia e alentejana com a publicação de poesia, contos e novelas, dedicando-se depois aos temas educativos e feministas. Foi professora do ensino particular no Algarve e Alentejo e, a partir de 1905, leccionou no Centro Escolar Republicano Afonso Costa e no Centro Escolar Republicano da Ajuda. Influenciada pelas teorias de Froëbel e de Maria Montessori, criticou o sistema de ensino régio por se centrar na memorização, por permitir castigos corporais e pela excessiva influência da doutrina católica. Em sua opinião, este sistema poderia ensinar a ler mas não ensinava a pensar.

Nos anos que antecederam a implantação da República, na linha da Escola Moderna de Francisco Ferrer y Guardia, defendeu a educação racional, laica, científica e integral, em que se aliassem a teoria e a prática no ensino das ciências, no trabalho das oficinas, nas experiências dos laboratórios e nas visitas de estudo, de modo a estimular a procura do conhecimento, a criatividade e o espírito crítico. Os valores da liberdade, da justiça e da solidariedade, bem como os princípios da honestidade, da ética e do civismo complementariam o programa educativo, capaz de formar cidadãos instruídos, autónomos e úteis à sociedade e à Pátria.

No tempo em que a literatura infantil começava a despontar em Portugal, graças a Ana de Castro Osório, Maria Veleda seguiu-lhe logo o exemplo e publicou, em 1902, uma colecção de contos para crianças, intitulada Biblioteca Infantil - Contos Cor-de- Rosa. Alguns destes contos já os tinha publicado antes nos jornais em que marcava presença assídua, como a Folha de Beja. Nesse mesmo ano, já muito preocupada com os problemas do analfabetismo e da submissão das mulheres à tutela masculina, aos preconceitos sociais e à doutrina da Igreja, publicou também o opúsculo Emancipação Feminina.


Quando se fixou em Lisboa e se tornou professora regente do Centro Escolar Republicano Afonso Costa, começou a escrever no jornal A Vanguarda, converteu-se aos ideais republicanos e foi iniciada na Maçonaria por Magalhães Lima, Grão-Mestre do Grande Oriente Lusitano Unido. Foi nos Centros Republicanos que conheceu os mais prestigiados dirigentes do Partido Republicano e começou a interessar-se pela política do país até se tornar uma brilhante oradora, tendo a oportunidade de discursar ao lado de Alexandre Braga, António Granjo, Bernardino Machado, Botto Machado, João Chagas, e Teófilo Braga, entre muitos outros.

Simultaneamente, conheceu Ana de Castro Osório, Joana de Almeida Nogueira, Olga Morais Sarmento da Silveira, Virginia Quaresma, Adelaide Cabete, Carolina Beatriz Ângelo e outras feministas, com as quais participou em tertúlias literárias, teceu amizades, polemizou nos jornais e teceu compromissos associativos. Participou na criação da Associação Fundadora de Escolas Maternais e do Grupo Português de Estudos Feministas, em 1907, da Liga Republicana das Mulheres Portuguesas, em 1908, e da Obra Maternal, em 1909. Esta última instituição que tinha por objectivo acolher e educar as crianças abandonadas, pedintes ou em perigo moral que circulavam nas ruas de Lisboa, foi dirigida por Maria Veleda desde a sua fundação até 1916, data em que passou para a tutela da Cruzada das Mulheres Portuguesas, destinando-se depois a apoiar os órfãos de guerra. A Obra Maternal atravessou tempos difíceis e Maria Veleda teve a ideia de criar um Grupo Dramático para representar peças de teatro feminista, educador e revolucionário, a fim de angariar os fundos necessários à sua manutenção. Não havendo peças teatrais com estas características, Maria Veleda lançou mãos à obra e escreveu cinco peças dramáticas e uma comédia: ‘Escrava’, ‘Redenção’, ‘A Lei’, ‘Mulher Ideal’, ‘Único Amor’ e ‘A Minha Menina’, representadas em Lisboa, nos Teatros Étoile, Trindade, Gimnásio e República.

O seu contributo para a instrução e educação não se esgotou no ensino de crianças e jovens, antes se ampliou com a criação, em 1908, de cursos nocturnos e cursos dominicais nos Centros Republicanos António José de Almeida e Botto Machado. Estes cursos, destinados a mulheres e raparigas analfabetas, obedeciam ao programa da instrução primária, complementado com conferências educativas sobre os mais variados temas científicos e políticos, como História, Geografia, Ciências da Natureza, Astronomia, Questões Sociais, Direitos e Deveres Cívicos, visando a sua preparação para o exercício de uma profissão e participação na vida política.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

As origens da emancipação feminina em Portugal

A herança iluminista que defendia a liberdade e a igualdade de todos os cidadãos mudou regimes políticos, laicizou a cultura e valorizou a instrução e a educação como motores de progresso económico e social e fontes de felicidade individual e colectiva. Algumas mulheres da burguesia culta e informada aproveitaram os ventos modernizadores que sopravam da Europa mais progressista e iniciaram o processo de emancipação feminina, emergindo no espaço público, sobretudo como tradutoras, escritoras e professoras.

Embora lentamente, muitas mulheres instruídas viram na escrita e no ensino uma forma de escaparem ao silêncio e à invisibilidade que, desde há muito, a sociedade impunha ao sexo feminino. Ao longo do século XIX, estas mulheres fazem da imprensa periódica a sua tribuna, exprimindo ideias, debatendo problemas e propondo soluções. É através da escrita que se afirmam como seres independentes, que se pretendem livres de qualquer tutela, e reclamam o lugar a que se julgam com direito na sociedade.

Se na primeira metade do século muitas se escondem sob o anonimato, na segunda metade vão assumindo sem preconceitos as suas identidades e aventuram-se na fundação e direcção de revistas e jornais e na propagação das ideias emancipadoras do direito à educação e ao exercício de uma profissão, a fim de se tornarem economicamente autónomas.

Em 1849, surge A Assembleia Literária, o primeiro jornal fundado e dirigido por uma mulher, Antónia Gertrudes Pusich, consagrado à instrução do sexo feminino. Nos anos que se seguem, entre os periódicos femininos destinados a entreter o dolce fare niente e a fomentar a frivolidade, aparecem outros apostados na defesa dos direitos das mulheres e na mudança de mentalidades e comportamentos sociais. Francisca Wood funda A Voz Feminina, em 1868 e O Progresso em 1869; Guiomar Torrezão toma a direcção d’O Almanaque das Senhoras em 1870; Elisa Curado dirige A Mulher, surgido em 1883; Beatriz Pinheiro funda e dirige A Ave Azul em 1899.

Na viragem do século, este grupo de mulheres dá lugar a outro que, também na imprensa, se vai assumindo como vanguarda mobilizadora do movimento feminista da primeira vaga que reivindica a igualdade de direitos jurídicos, económicos, civis e políticos entre os sexos. Se no início, a convergência de ideais unia mulheres conservadoras e monárquicas, como Olga Morais Sarmento da Silveira e Domitila de Carvalho, às republicanas Ana de Castro Osório, Adelaide Cabete, Maria Veleda e Carolina Beatriz Ângelo, entre outras, com a aproximação destas últimas ao Partido Republicano, dá-se a cisão definitiva.

Nas primeiras décadas do século XX surgem assim as associações femininas e feministas que agregam mulheres de todos os estratos sociais: escritoras, professoras, médicas, advogadas, comerciantes, industriais, costureiras, domésticas... As mulheres republicanas fundam, em 1907, o «Grupo Português de Estudos Feministas», em 1909, «A Liga Republicana das Mulheres Portuguesas», em 1911, a «Associação de Propaganda Feminista», em 1914, o «Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas», em 1915, a «Associação Feminina de Propaganda Democrática» e, em 1916, a «Cruzada das Mulheres Portuguesas».

A aliança entre os dirigentes do Partido Republicano e as mulheres republicanas foi reforçada com a iniciação de muitas delas na Maçonaria e a militância activa na «Loja Humanidade», agremiação feminina com igualdade de direitos e de representação nas hierarquias maçónicas. Naquela época, maçonaria feminina, República e feminismo eram expressões do mesmo ideal e espaços de intervenção na conquista da liberdade, da igualdade e do direito de cidadania.