domingo, 26 de junho de 2011

culturafamalicao: maria veleda, a vermelha feminista

culturafamalicao: maria veleda, a vermelha feminista: "“Pobres éramos, pobres ficámos e pobres somos, mas nas nossas almas arde sempre a mesma chama sacrossanta que nos iluminava quando gritámos..."

sexta-feira, 17 de junho de 2011

As propostas reformadoras do ensino

A par das críticas ao sistema, Maria Veleda propõe uma reforma “urgente e enérgica” do ensino e reclama a escolarização das raparigas em situação de igualdade com os rapazes, porque, como ela escreve em 1909, “A educação tem que obedecer ao poder evolutivo do progresso, se quisermos reformar a sociedade, prepará-la para um futuro mais belo e melhor.”

Neste sentido, ela própria começa a inovar. Recorre a estratégias que pretendem tornar a aprendizagem mais atractiva, aliando instrução e educação e sensibilizando para novas dimensões do saber. Nas escolas em que ensina, promove festas infantis com representações teatrais, danças e cantares, inventa jogos, escreve contos e incentiva as crianças a recolherem lendas e tradições regionais e a escreverem também.

Mais tarde, depois de aderir aos ideais da República e ao livre-pensamento, defendeu a educação integral, laica e racional.

Por “educação integral”, Maria Veleda entendia uma educação centrada no desenvolvimento harmonioso das crianças, valorizando igualmente as vertentes da instrução teórica e prática, o exercício físico ou desporto, o contacto com a natureza e a formação ética e cívica. Esta educação far-se-ia por etapas: escola maternal, escola primária, escola superior, Universidades Livres e Populares, reunindo em todas elas os oficinas, as conferências e as visitas de estudo.

A escola laica seria a escola livre, sem compêndios nem imposições, mas com um programa definido e orientado pelos ideais do racionalismo científico, em que se aliassem instrução rigorosa, autonomia, criatividade, espírito de liberdade, amor pelo trabalho, pela verdade e pela justiça, sentido do dever, tolerância, respeito pelo Outro e formação para a cidadania.

Este modelo educativo seria aplicado em regime de coeducação, para que ambos os sexos confraternizassem e se conhecessem melhor, evitando assim que as mulheres continuassem a ver os homens como seres perigosos de que deviam afastar-se, porque o seu convívio podia comprometê-las, e os homens continuassem a encarar as mulheres como seres inferiores, cujo contacto podia amesquinhá-los.

Era de opinião que não se devia interditar às raparigas a participação nas brincadeiras dos rapazes. Seria mais saudável correrem e saltarem ao ar livre que manterem-se fechadas em casa, crescendo “enfezadas” de corpo e espírito. Só a coeducação, o convívio e o conhecimento mútuo, na escola e fora dela, apagariam os preconceitos sociais que sustentavam as desigualdades entre os sexos.

O ensino integral e coeducativo que Maria Veleda idealizava e que julgava não ser uma utopia não era sequer praticado nas escolas ditas liberais dos Centros Republicanos, a que Manuel de Arriaga chamava “capelinhas da liberdade” e onde a instrução era complementada com a educação cívica.

Ela considerava que a escola para ser laica e democrática não lhe bastava abolir o ensino da religião; tinha de responder aos anseios e necessidades das sociedades modernas.

Para desenvolver a educação cívica das crianças, propunha a criação de caixas escolares de auxílio mútuo e a promoção de situações educativas em que elas pudessem manifestar as suas opiniões e usar consciente e livremente o voto, interiorizando assim os valores do associativismo e da solidariedade e aprendendo a exercer os seus direitos em liberdade e democracia.

A avaliação dos alunos também lhe mereceu algumas considerações. Na sua perspectiva, o exame, como instrumento único de avaliação, deveria ser erradicado, porque nada provava sobre os conhecimentos adquiridos pelos alunos.

Neste sentido, ela preconizava: e cito “esse processo antiquado há-de desaparecer quando a educação se fizer conscienciosamente; quando das notas colhidas no decorrer de um ano lectivo e das aptidões demonstradas durante esse período se fizer prova mais segura e muito mais conveniente.”

Ora, o tempo deu-lhe razão. O nosso sistema educativo erradicou os exames por alguns anos, voltando embora a recuperá-los.

As críticas ao sistema educativo no tempo da monarquia


Na viragem do século XIX, Maria Veleda, baseando-se na sua experiência de professora, condenava o sistema de ensino vigente por submeter as crianças a uma disciplina rígida, quase militar, e permitir a aplicação de castigos corporais e outros igualmente humilhantes, transformando a escola num espaço repressor e os professores em algozes da vivacidade e alegria infantis.

Na sua perspectiva, o castigo era avesso ao gosto de aprender e por isso os alunos saíam da escola com uma instrução rudimentar e limitada. Sendo obrigados a papaguear coisas que não entendiam, aprenderiam a ler mas seriam incapazes de aprender a pensar.

Este regime estava caduco e inadequado às exigências modernas, pois descurava a educação das raparigas, futuras mães e educadoras, e obrigava os professores a dar aulas a turmas de quarenta e cinquenta alunos, em salas acanhadas, mal iluminadas e sem condições pedagógicas, o que os impedia de conhecerem as capacidades e o carácter de cada um, de forma a poderem ministrar uma educação apropriada a cada caso.

É de salientar a preocupação de Maria Veleda em conhecer bem as crianças para as poder educar em conformidade, o que se afigura prenunciador do ensino individualizado que ainda hoje se pretende implementar como ideal, apesar da crescente massificação e democratização.

Quando já se encontrava em Lisboa, como professora do Centro Escolar Republicano Afonso Costa, condenou veementemente a “perniciosa” influência do clero no ensino e a submissão dos programas educativos à doutrina da Igreja.

Após a implantação da República e na sequência da publicação da Reforma da Instrução Primária, denunciou as desigualdades de estatuto profissional entre os professores do ensino oficial e os do ensino livre ou particular. Estes não podiam fazer parte dos júris de exames, não progrediam na carreira, não tinham direito à aposentação, nem podiam ingressar automaticamente nos quadros das escolas estatais.

Clamando pela igualdade de direitos, condenou o governo provisório por não corrigir a situação herdada da monarquia e, sobretudo, por ter ignorado o contributo destes professores para a divulgação dos ideais da República, visto que a maioria esteve muitos anos ao serviço dos Centros Escolares Republicanos e de outras Escolas liberais.

As concepções de Maria Veleda sobre a educação das crianças

Maria Veleda, Alves Torgo e aluna(o)s do Centro Escolar Republicano Afonso Costa

A vocação de Maria Veleda para o ensino prende-se com a sensibilidade e a afectividade que a levam a gostar das crianças e a apaixonar-se pela tarefa de as educar.

Ela acreditava que a educação era a luz que iluminava as vidas, o motor do progresso económico e da transformação social, a fonte de felicidade individual e colectiva.

As crianças simbolizavam a esperança e o futuro; instruí-las e educá-las eram as melhores garantias para a construção de um mundo novo.

No início do século XX, Maria Veleda escrevia o seguinte:

“Educar é amar. Da educação, boa ou má, proveitosa ou negativa que se ministrar hoje, depende a glória ou a baixeza de amanhã. Se uma criança que morre pode ser um miserável de menos, também pode ser uma esperança que se desfolha. Por isso, eu amo as crianças. Amo-as porque são fracas e desprotegidas... e também porque o Futuro lhes pertence, porque de cada uma há-de jorrar a luz que ilumine a treva desta sociedade injusta e gangrenosa.”

A crença na educação como fundamento de uma sociedade mais justa e melhor mantêm-se ao longo da vida. Quarenta anos depois, num discurso sobre educação infantil, dizia ainda:

“A escola é o largo horizonte onde flameja o sol rutilante e acolhedor da instrução... completada com a educação, cimentada no espírito de Igualdade, de Justiça e de Solidariedade que devem preparar os homens de hoje para a sociedade unificadora de amanhã.”

A importância atribuída à escola está intimimamente ligada às qualidades científicas, pedagógicas e éticas que, segundo Maria Veleda, os professores devem possuir, porque é preciso "ser bem educada(o) para poder educar bem. Os professores devem ter da vida uma concepção nítida e perfeita...; estar ao corrente dos progressos científicos e culturais da civilização mundial e, sobretudo, terem um espírito fino e delicado, uma alma feita para compreender todas as misérias sociais e pronta a procurar-lhes lenitivo."

Em seu entender, as professoras e os professores deviam entregar-se à tarefa de educar com amor, dedicação e espírito de missão quase religioso, para que a escola se transformasse no farol que iluminasse as trevas da ignorância e na forja que preparasse homens e mulheres livres, conscientes, responsáveis e intervenientes na sociedade, porque “a educação deve ser o primeiro e o mais importante cuidado dos que trabalham em prol da emancipação humana.”

domingo, 12 de junho de 2011

Conferência no Museu Bernardino Machado


Convido-vos para a conferência "Maria Veleda (1871-1955). Feminista republicana, pedagoga e livre-pensadora", no Museu Bernardino Machado (Famalicão).