sexta-feira, 17 de junho de 2011

As propostas reformadoras do ensino

A par das críticas ao sistema, Maria Veleda propõe uma reforma “urgente e enérgica” do ensino e reclama a escolarização das raparigas em situação de igualdade com os rapazes, porque, como ela escreve em 1909, “A educação tem que obedecer ao poder evolutivo do progresso, se quisermos reformar a sociedade, prepará-la para um futuro mais belo e melhor.”

Neste sentido, ela própria começa a inovar. Recorre a estratégias que pretendem tornar a aprendizagem mais atractiva, aliando instrução e educação e sensibilizando para novas dimensões do saber. Nas escolas em que ensina, promove festas infantis com representações teatrais, danças e cantares, inventa jogos, escreve contos e incentiva as crianças a recolherem lendas e tradições regionais e a escreverem também.

Mais tarde, depois de aderir aos ideais da República e ao livre-pensamento, defendeu a educação integral, laica e racional.

Por “educação integral”, Maria Veleda entendia uma educação centrada no desenvolvimento harmonioso das crianças, valorizando igualmente as vertentes da instrução teórica e prática, o exercício físico ou desporto, o contacto com a natureza e a formação ética e cívica. Esta educação far-se-ia por etapas: escola maternal, escola primária, escola superior, Universidades Livres e Populares, reunindo em todas elas os oficinas, as conferências e as visitas de estudo.

A escola laica seria a escola livre, sem compêndios nem imposições, mas com um programa definido e orientado pelos ideais do racionalismo científico, em que se aliassem instrução rigorosa, autonomia, criatividade, espírito de liberdade, amor pelo trabalho, pela verdade e pela justiça, sentido do dever, tolerância, respeito pelo Outro e formação para a cidadania.

Este modelo educativo seria aplicado em regime de coeducação, para que ambos os sexos confraternizassem e se conhecessem melhor, evitando assim que as mulheres continuassem a ver os homens como seres perigosos de que deviam afastar-se, porque o seu convívio podia comprometê-las, e os homens continuassem a encarar as mulheres como seres inferiores, cujo contacto podia amesquinhá-los.

Era de opinião que não se devia interditar às raparigas a participação nas brincadeiras dos rapazes. Seria mais saudável correrem e saltarem ao ar livre que manterem-se fechadas em casa, crescendo “enfezadas” de corpo e espírito. Só a coeducação, o convívio e o conhecimento mútuo, na escola e fora dela, apagariam os preconceitos sociais que sustentavam as desigualdades entre os sexos.

O ensino integral e coeducativo que Maria Veleda idealizava e que julgava não ser uma utopia não era sequer praticado nas escolas ditas liberais dos Centros Republicanos, a que Manuel de Arriaga chamava “capelinhas da liberdade” e onde a instrução era complementada com a educação cívica.

Ela considerava que a escola para ser laica e democrática não lhe bastava abolir o ensino da religião; tinha de responder aos anseios e necessidades das sociedades modernas.

Para desenvolver a educação cívica das crianças, propunha a criação de caixas escolares de auxílio mútuo e a promoção de situações educativas em que elas pudessem manifestar as suas opiniões e usar consciente e livremente o voto, interiorizando assim os valores do associativismo e da solidariedade e aprendendo a exercer os seus direitos em liberdade e democracia.

A avaliação dos alunos também lhe mereceu algumas considerações. Na sua perspectiva, o exame, como instrumento único de avaliação, deveria ser erradicado, porque nada provava sobre os conhecimentos adquiridos pelos alunos.

Neste sentido, ela preconizava: e cito “esse processo antiquado há-de desaparecer quando a educação se fizer conscienciosamente; quando das notas colhidas no decorrer de um ano lectivo e das aptidões demonstradas durante esse período se fizer prova mais segura e muito mais conveniente.”

Ora, o tempo deu-lhe razão. O nosso sistema educativo erradicou os exames por alguns anos, voltando embora a recuperá-los.

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